Depende de nós, Slutt

Eu encontrei ela perambulando pelo centro da cidade com uma bolsa pendurada no ombro e um óculos escuro. Ela andava calma e quieta demais, e eu estava no carro sem saber o que fazer. Tudo bem que ela era louca de andar sozinha as onze da noite em uma avenida perigosa, mas mais louco ainda era eu, que tava seguindo ela desde que soube que tinha "sumido".




Parei o carro e desci. Fiquei encostado na árvore uns cem metros na frente dela, esperando ela me ver ali e me mandar para a terra do nunca e começar a me xingar sem parar. Mas não foi assim. Ela me viu e depois do choque, se desesperou até finalmente encontrar meus braços e apertar minhas costelas. Seus sussurros de pavor eram impossíveis de serem ouvidos, mas eu ainda estava ali.

Tentei acalma-la e conversar com ela. Mas o choro descontrolado simplesmente não deixava. Segurei seus braços e a levei para o carro, trancando todas as portas e ligando o ar. A temperatura na rua passava dos trinta graus e ela estava molhada de suor.

— Eu queria entender por que você estava aqui, sozinha. Por que foi que você sumiu assim sem avisar ninguém. Por que, afinal, fez tudo isso, cara?

Ela me olhou e ficou em modo fetal no banco do carro, fitando duramente as ruas na sua frente. Liguei o motor e a levei pra casa, temendo o porque de tudo aquilo.

— Pronto, Mag. Está em casa. Entra, toma um banho e deita. Dorme. Você está precisando. 

— Não quero. — tive que fazer uma força absurda pra ouvir o que ela disse. — Fica comigo essa noite.

— Que? Preciso ir pra casa, e você pra sua. Sua mãe já sabe que está comigo e está bem. 

— Fica só essa noite. Por favor. — seus olhos se enxeram de lágrimas e sua voz ficou embargada. 

Tirei o cinto dela e de mim, e a puxei para os meus braços, abrançando-a muito forte e beijando seu pescoço. 

— Diz.

— Acho que todos tem problemas em casa e na rua, não sou diferente, Slutt. Problemas, dores de cabeça, medo e... todo o resto. Você é meu amigo a muito tempo, e eu tô cansada disso, para ser bem sincera. Estava querendo só um tempo para pensar, para mim. Ai você apareceu, e no mesmo instante que não queria te ver, você era tudo que eu queria que estivesse ali, e você estava.

— Mag...

— Cala a boca, Slutt. Tô falando, cara. Para de interromper. — a Mag que eu conhecia estava de volta com o mau humor de sempre — Tô tentando dizer que eu curto você, mesmo não devendo nem querendo. Eu curto! Só não compartilho, mas cutuco, comento, todas essas coisas.

— Também.

— Também se curte, é!? — ela riu. — Desculpa e obrigada. Depois a gente se fala.

— A gente tem que parar com isso, Mag. — a perna direita dela já estava fora do carro. Ela parou, respirou fundo e olhou por cima do ombro.

— Não depende só de mim, Slut. — e saiu. 

(Gabriela Cadamuro - Cranela)

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