Ah, se o mundo inteiro pudesse me ouvir, tenho muito para contar
Todos os dias acordamos, olhamos para o relógio e são horas
atrasado ou horas de “um pouquinho mais de sono”. Nossa vida é sempre nessa
correria de levantar, trabalho, faculdade, lazer, beber, amigos, cigarros e
dormir. Não acha que falta uma coisinha? Uma coisinha que te completa, que te
faz se sentir vivo, te faz se sentir no tal sonhado paraíso cristão. O que
seria essa coisinha? Vamos lá, você consegue! Força seu pensamento, não é difícil.
Sim, o amor. Ahhh, o amor! Amor, uma palavra com poucas
letras e com um sentimento indescritível. Amor, um sentimento que te vira do
avesso, deixa seu mundo de pernas para o ar, cabeça pirada como se estivesse usado
uma droga tão forte que se torna um vício. Amor, um sentimento que hoje, por
muitos, não é mais valorizado, um sentimento onde todos têm medo de que venha,
medo de que esse sentimento tão gostoso, maravilhoso, se torne sofrimento, que
te leve do céu ao inferno num estalar dos dedos. Mas não vim aqui publicar meu
texto ensinando como amar, não.
Só vim aqui para dizer que no natal de 1995, conheci Márcia,
uma mulher meiga, tão linda quanto esse sol que está raiando lá fora. Conheci
ela num bar/cafeteria em Londres, e ainda foi por acaso, acredita? Ela
trabalhava nesse bar e eu estava desanimado com a vida, pensante e desesperado
pois essa coisa que se chamava amor, eu não sentia mais, não sabia mais como
era depois que minha mulher, Amanda, morreu de câncer. Mas no exato momento em
que vi Márcia, acho que esse sentimento veio à tona. Sabe quando você fica
viajando no jeito da pessoa, fica ali, como se o tempo não existisse mais ou que
tudo parasse e só estava Márcia em pé com uma garrafa de café passando de mesa
em mesa? Até chegar na minha. Fiquei sem reação quando ela me viu e me abriu
um sorriso. Cara, que sorriso lindo, faltava um dente mas era maravilhoso da
mesma forma. Sim, era o amor. E, ao som de Tim Maia eu estou escrevendo e
lembrando dessa história que nunca mais voltou.
Com muito custo voltei no outro
dia e sentei na mesma mesa e lá estava Márcia com o seu jaleco e com o seu
corpo bronzeado que só uma brasileira tem e que corpo, hein?
Depois de muitos dias indo e vindo naquele bar, resolvi
pedir seu telefone e chama-la para sair, mas sou desastrado com as palavras e
não sabia como falar com essa mulher, ao qual estava na minha cabeça durante
24 horas e milhares de minutos. Mas enfim, consegui chama-la para sair e fomos ao
cinema ver um filme de terror. Sim, terror. Era o gosto da Márcia, apaixonada
por coisas que assustavam e isso me fez gostar de filmes de terror também,
mesmo que eu odiasse, mas tem aquela, o que o amor não faz? E nisso fui
descobrindo seus gostos, seus defeitos, qualidades, que me faziam apaixonar cada
vez mais por ela.
Me peguei esses dias pensando na Amanda, minha mulher que
morreu de câncer, lembra? Ela também despertou em mim esse sentimento ao qual
quase ninguém tinha conseguido. Elas eram diferentes, pessoas totalmente
diferentes. Amanda era loura, dos olhos azuis e com um sorriso muito largo e
lábios carnudos. Márcia era morena de cabelos longos, olhos escuros e lábios
ralos mas que me chamavam de uma maneira que eu não conseguia me controlar
quando estava ao seu lado.
Passou dias e fomos nos conhecendo cada vez mais e acho que
fomos nos apaixonando cada vez mais também, pois quando Márcia me via, ela se
enchia de felicidade e seu rosto ficava brilhando feito lua em uma noite de
cheia, mas não demonstrara, era muito fechada, porém muito doce. Saímos
mais uma vez, fomos a um outro bar na cidade de Liverpool e acabamos bebendo
demais, saindo de lá trançando as pernas e quase que não conseguíamos andar. Rindo sem parar, feito duas crianças que tinham acabado de ganhar o melhor
presente do mundo. Levei Márcia para minha casa em Manchester.
Moro num
apartamento/sala que ficava na rua Sr. Alex Ferguson, nº 009, era um prédio meio
antigo com mobílias mais antigas que o próprio prédio mas eu era feliz em morar
naquele lugar. Moro lá desde que cheguei do Brasil em 1989, fui resolver minha
vida, fazer uma faculdade pra ver se conseguiria tomar um rumo em minha vida e
acabei ficando por lá mesmo, mas havia uma coisa que ficava me incomodando o
tempo todo, o que era? Eu me perguntava, e sempre quando via documentários de
viagens eu me sentia triste de um lado, mas muito feliz em imaginar cada ponto em que eu
poderia passar desse mundo.
Chegamos em meu apartamento, um agarrado ao outro
de tão bêbados e fomos fumar alguns cigarros para terminar a noite, mas
pressentia que algo poderia rolar entre nós. Aproveitei, liguei o som e coloquei Tim Maia, sim, era apaixonado pelas musicas do Tim, posso chama-lo de
Tim né? Acho que a maioria que gostava dele o chamava assim, e por incrível que
pareça Márcia também tinha afinidade com as músicas de Tim, mas nada a mais, eu
que era apaixonadamente apaixonado pelas suas músicas e pelas suas palavras. E
foi ai que Márcia começou a dançar, a remexer e mexer aquele corpo que eu dizia
ser como um violão, aqueles cabelos passavam em minhas mãos e tudo rodava, até
que segurei sua mão e a puxei logo tascando um beijo. Na hora eu achei que ela
iria hesitar, iria me empurrar e perguntar o por que eu fiz isso, mas não, na
mesma hora ela me abraçou e me beijou também. Nessa noite eu senti sim que o
amor havia voltado, que o amor estava exalando em mim.
(Conto escrito por João Pedro Sanches)
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