O dia em que câncer (des)encontrou virgem



Ontem, pela manhã, eu andava distraído, chutando as pedrinhas que eu via no chão enquanto pensava no que eu poderia te dizer, já que toda essa nossa confusão tá aumentando. Foi ai que eu decidi pegar o celular e te ligar.

- Oi.
- Oi.
- Onde você tá? 
- Em casa.
- Pode me encontrar?
- Hoje não tenho tempo.

Desligou. Depois de um tempo eu acho que as pessoas vão ficando mais frias e, por mais que eu tentasse esquentar nosso "relacionamento" às avessas, você não parecia estar muito afim disso. Parecia gostar do gelo que te encobria e, não queria por nada, deixar que eu te derretesse. Fui pra casa tentando não pensar em você. Deixei pro dia seguinte a noite e te liguei.

- Pode hoje?
- Não sei se devo. Acho que precisamos conversar...
- Eu também quero conversar.
- Tudo bem.
- Vou te buscar. 
- Acho... tá, venha.

Eu iria pedi-la em namoro se ela não tivesse ido direto ao assunto que queria me dizer. Não houve lágrimas, mas sim uma voz acanhada de pena. Agora ela sentia pena de mim, por ter que terminar um relacionamento que nem havia começado. Seus olhos eram fundos e demonstravam como tudo aquilo era em vão, porque ela sabia que eu resistiria - ou achava que sabia.

- E o que você tinha para me dizer?
- Nada. Na verdade era o mesmo que você. Concordo que nós estamos avançando rápido e isso tem que acabar.
- Ah, sim! Que bom que está de acordo, gosto de você e assim ninguém sofre.
- Claro, ninguém. 

Deixei-a em casa e fui para a minha. Dentre todas as pessoas do mundo tinha que ser justo você? Sei que meu signo é bem culpado por todo esse sentimento desenfreado que me corrói aqui por dentro, mas eu não estou errado. Nunca vi virginiana como você, as pessoas que conheço não são como você. É como se seu jeito fosse extremista e eu? Meu Deus, eu sou tão molenga. 

Acho que passou umas duas semanas até que meu coração trouxa de canceriano  não aguentasse mais e ligasse pra ela de novo.

- Oi.
- O que foi?
- Fica? 
- A gente já conversou sobre isso, não é assim.
- Tô sentindo sua falta, fica, volta, sei lá, tenta de novo.
- Não.

Ficamos em silêncio. Eu chorava sem que ela ouvisse. Aquilo doía.

Tá, tudo bem, pode ir embora se é isso que você quer e acha certo. Mas não volta, não ache que você vai encontrar mais que isso, porque não vai.
- Mais que isso o que?
- Mais que eu, meu amor, o tanto que me dei e doei a você.
- Tá me jogando praga?
- Pelo amor de Deus, não! Só quero que você pare de achar que a gente vive num mundo encantado. Não vivemos! E outra, eu não sou o teu passado, que fique bem claro.
- Mas não é mesmo e não vivemos, eu sei.
- Que bom que não me considera passado. Nem futuro. Quem dirá presente.
- Para, por favor.
- Vai, não vou te pedir mais pra ficar, já me humilhei muito. A
inda tá aqui porque? 
- Certo.
Desligou. Eu nunca mais a vi. Na verdade vi sim, de longe, nas festas, sem poder fazer mais nada além disso. Olhar. Eu ainda sinto saudade, falta. É como se enfiassem uma faquinha no meu peito e a girassem. Quando você não tá, tudo certo. Mas ai algo me lembra teu jeito e... Acho que preciso me reinventar. Ei Deus, rola uma mãozinha?

Cranela

Share:

0 comentários