Uma bela, humana e comovente história biográfica


A transexualidade atingiu um novo patamar na cultura pop em 2015 e nesse começo de 2016. De cabeça, posso citar a midiática transformação do ex-atleta Bruce Jenner em Caitlyn Jenner, as atrizes transexuais Jamie Clayton e Laverne Cox, das séries Sense8 e Orange is the new Black, ambas da Netflix, vem conquistando prestígio na mídia. E não seria diferente com “A Garota Dinamarquesa”, que teve sua estreia em 11 de fevereiro aqui no Brasil.

Passada no começo da década de 20 em Copenhague, Dinamarca, a história conta a vida do pintor Einar Wegener, muito conhecido pelas suas paisagens pantanosas de sua infância, e de sua esposa, Greta, que pinta retratos para os burgueses e está lutando para ser mais reconhecida. O casamento dos dois era como qualquer outro durante seis anos, até que um dia, Greta pede para que o marido coloque um vestido para que ela possa terminar um quadro, e tudo acaba mudando a partir daquele instante. 


De uma brincadeira entre marido e mulher, Einar acaba descobrindo que dentro dele há uma moça chamada Lili, a muito tempo adormecida, e que precisa ser mostrada para o mundo. Ela passa a posar usando vestidos para que sua mulher possa pintá-la, e a sair na rua assim, chamando a atenção de rapazes e de todos os que estão em volta. O que antes era apenas diversão acaba se tornando uma vida, e uma questão de saúde. A história mostra como Einar lutou com “garras e dentes” durante o dia-a-dia para se tornar Lili, como sua mulher, amigos e os seus conhecidos mais próximos, e mesmo os distantes, reagem a isso, e como ela sacrificou toda a vida que conhecia para viver uma que realmente valesse a pena.

Com uma fisionomia pouco atrativa e, ao mesmo tempo, singular, Eddie Redmayne, tem também uma androgenia que o torna uma escolha perfeita para viver Lili nas telas. E se restava alguma dúvida sobre o seu talento desse vencedor do Oscar “A Teoria de Tudo”, em “A Garota Dinamarquesa” o vemos novamente em um trabalho extremamente meticuloso de composição. 

A química entre Redmayne e Vinkader funcionou com eficácia e harmonia, permitindo que o talento individual de cada um fosse explorado de maneiras distintas. Eu chorei muito com esse filme porque dá para sentir todas as angústias e dores que a Lili sofre até aceitar quem ela realmente é! 


Escrever uma crítica não é somente julgar, mas, ter empatia. Conhecer o tema... ou determinado assunto. O autor levou em consideração não somente uma história comovente e sofrimentos extremos, mas algo em comum... O amor. Mostra toda a sensibilidade não compreendida dos transexuais que sofrem com a falta de respeito e apoio da família, amigos e da sociedade. Deixa evidente a diferença entre ser um homem/mulher trans ou de alguém fisicamente com características femininas e se travesse de "mulher". Ser transexual é muito mais que isso. Onde nesse roteiro mostra uma parte de toda a "odisseia" vivida por indivíduos trans. Um excelente filme com atores fiéis ao papel de maneira superbe! 

A humanização da relação das duas protagonistas (nesse caso do Redmayne e da Vinkader) é belíssima e a sinceridade com que o filme trata o dilema da Lili é tocante. Sem nunca cair para o completo melodrama, sempre dando asas à sutileza, em cenas que insinuam sentimentos ao invés de ficarem colocando o personagem para narrar o que sente. O ponto de vista da história quer enfatizar a luta pelo qual um transgênero precisa passar para aceitar a sua condição e romper com barreiras psicológicas. Não é uma situação fácil, algo que nenhum cisgênero deve ser capaz de entender, mas filmes como esse, sem dúvida, servem para ajudar nisso. 


“A Garota Dinamarquesa” é uma adaptação do livro homônimo de David Ebershoff, porém, é preciso levar em consideração que muitos fatos foram infundados para surtir dramatização à história que ele quer contar. O ponto partida da verdadeira história de Lili está na sua autobiografia “Man Into Woman”, mas que se aproveita de breves momentos para mostrar ações que, infelizmente, se repetem até hoje em dia, como a agressão (em muitos casos, fatais) contra os transexuais e homossexuais, e também a repressão contra as mulheres. 

Mas é isso, mais do que contar uma importante história, o grande trunfo desse filme é trazer para o grande público a temática trans e a importância de respeitar a identificação do próximo. Uma obra comovente, de muita sensibilidade, superação e situado numa época que transexualidade/homossexualidade era tratado como doença.

Colaboração do leitor Tom Martins

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