Por que não?



Ana perdeu seu filho de 3 anos quando estacionava o carro na garagem, ele estava atrás do carro esperando por ela, mas ela não o viu, foi um acidente que ela não superou.
Pedro nunca levou a filha de 2 anos para a natação antes, mas naquele dia sua mulher estava doente e coube a ele levar. A neném estava dormindo, e assim ele passou direto para o trabalho, fechou a porta do carro e só se lembrou dela horas depois, tarde demais, ela já havia ficado completamente sem ar. Foi um acidente que ele não superou.
Eliza se descuidou da filha de 3 anos por 5 minutos enquanto ela arrumava a casa, a menina foi para a piscina e o som estava ligado,  como era costume. Quando ela se lembrou já era tarde, a fralda pesou na água e puxou-a para baixo. Foi um acidente que ela não superou.
O que você tem em comum com essas três pessoas? Tempo.
Elas dariam tudo para voltar horas ou minutos atrás e desfazer o já então feito. E se? Quantas vezes Ana pensou: E se não tivesse chovendo naquele dia e ela esperasse um pouco mais no trabalho. Pedro pensará: E se eu tivesse me recusado a levá-la na natação pois estava atordoado com o trabalho. E finalmente Eliza: E se eu tivesse trancado o acesso para a piscina como deveria e não tivesse me descuidado lavando a louça.
Sei que por certo você que me lê agora terá inúmeras ocasiões para pensar sobre o E se. Grande parte delas estaria ligada ao passado, ações já realizadas, erros a serem reparados. Mas não é sobre o e se, é sobre o tempo que você não mais vive que te ligo a essas 3 pessoas.
É o desperdício de tempo recusando convites de amigos pois você está mal demais para sair, é o desperdício se entupindo de comidas industriais, quando poderia se arriscar na cozinha. É o desperdício em não dizer “eu te amo”, pois tem medo. É o desperdício em se arriscar em algo que queira muito. Desperdício. Ana, Pedro e Eliza não mais vivem em função de seus traumas, e hoje passam horas na terapia e dormem com ajuda de medicamentos. Sei que um dia os três finalmente poderão se perdoar e seguir em frente.
Mas e quanto a você e seu trauma de viver? O seu excesso em dormir, o zelo com o corpo mas não com o que pensa sobre ele. Você não tem grandes feitos a serem perdoados, mas grandes a serem aceitos. Você precisa se aceitar primeiro, se amar primeiro, deixar o e se, e finalmente dizer: por que não?
São coisas que digo para mim, também.


Larissa Araújo, colunista. 

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